O demônio

3 de dezembro de 2020

O demônio

Data de Publicação: 3 de dezembro de 2020 19:03:00 ESPÍRITOS - As perturbações que atormentam a nossa cabeça podem ser maiores do que imaginamos, muito maiores mesmo.

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SEM TEMPO? ENTÃO VEJA O RESUMO

A suspeita de que está possuído pelo demônio leva um homem a quase cometer um crime. Mas ele consegue se livrar desse sentimento antes do pior. O que ele não imaginava é que o demônio não foi embora.

 

 

- Saia desse corpo. Ele não te pertence. Saia, seu demônio. Se não sair, eu vou te torturar.

O homem possuído vai se deitando à medida que o pastor impõe as mãos sobre ele.

Chega um ponto que ele cai no chão e rola de um lado para o outro. O homem baba, se contorce, grita, fica de olhos arregalados.

- Meu Deus, esse demônio é muito forte. Eu vou sair daqui. Vai que ele sai de lá e entra aqui.

- Como assim Eugênio?

- Ah Bárbara, eu tenho medo de ser possuído. Minha vida já está desgraçada. Se acontecer isso, aí é que eu vou para o beleléu.

- Pare de bobagem Eugênio. Estamos aqui para receber a graça do senhor.

- Eu sei, mas ninguém garante que estejamos livres. Olha esse coitado. Acha que ele queria?

- Ninguém está livre do demônio, mas temos de orar para que ele se afaste.

- Eu vou orar em casa.

- Eugênio, ela grita. – Nós viemos aqui pedir ajuda para você encontrar um emprego.

- Eu sei, mas não vou esperar.

Quando está saindo, Eugênio passa perto do pastor e do homem possuído.

- Saia desse corpo. Eu não vou falar mais. Você está me desafiando? Quer testar o meu poder?

Eugênio para um pouco para ver o acirramento da expulsão do demônio.

Nesse momento, o demônio sai do corpo do homem que está frente a frente com o pastor.

Um vento frio varre o rosto e o corpo de Eugênio. Ele olha para os lados. Não está ventando. Nem tem portas ou janelas abertas.

- Eita, será que fui premiado?

- Pare de besteira Eugênio. Vai, anda. Vamos embora então. Senão, daqui a pouco o pastor percebe e vai nos chamar de volta.

Os dois saem do templo de mansinho.

 

No outro dia de manhã, Eugênio e Bárbara estão tomando café à mesa da cozinha.

Bárbara nem nota os olhos vermelhos dele.

Ela está com pressa porque se levantou tarde para trabalhar e precisa correr agora.

Eugênio não dormira a noite toda por causa da preocupação com o demônio.

Ele olha a mulher com curiosidade.

O rosto afilado emoldurado por um cabelo volumoso e loiro lhe davam um aspecto suave.

Mas alguma coisa nela não lhe agradava.

Ele não sabia o que era.

Como alguma coisa poderia destoar tanto?

Era algo que o irritava.

Olhou para o nariz, fino e pequeno. Não era ele. Olhou para a boca, pequena também, lábios finos. Não era. Talvez os olhos. As sobrancelhas arqueadas. Ela era bonita. Mas tinha algo que não estava bem. Algo sutil que tinha nascido nela. Era uma coisa que ele não via, mas sentia.

Uma voz interna dizia que ela precisava ser afastada. Precisava ser desprezada. Precisava ser eliminada para não perturbar mais.

O que estava dizendo?

Ele não concordava com aquilo.

Que loucura era aquela?

Mas parecia como uma espécie de cheiro. Impregnava o ar. Tomava conta dele.

Eugênio olhou fixamente para Bárbara.

Não entendia nada, mas sentia que precisava fazer alguma coisa, tomar uma atitude.

Ela não se deu conta de nada.

A mão de Eugênio foi involuntariamente percorrendo a mesa até chegar na faca.

Ele segurou o cabo com força.

Era um golpe só. Não podia errar. Acertaria a garganta dela. Não teria tempo de fugir.

Não, ele não poderia fazer isso.

Precisa fazer, a voz interna gritava.

Em um impulso, Eugênio se levantou com a faca na mão pronto para dar o golpe fatal.

A mulher se afastou da mesa sem perceber.

Fora pegar o pão na cesta.

O tempo suficiente para que Eugênio vencesse a voz e colocasse a faca na mesa.

- O que foi?

Só agora Bárbara percebera que ele estava com a faca na mão de forma estranha.

- Não, nada. Fui só te dar a faca para cortar o pão. Só isso meu amor.

- Nossa, como seus olhos estão vermelhos.

- Estão é? Não percebi. Dormi mal.

- Veja se descansa. Estou indo trabalhar. Me dá um beijo. Vem, amor.

Ela estica a boca para o beijo.

Ele beija, mas ainda sente algo o afastar.

Bárbara segue para o trabalho.

 

Sem emprego, Eugênio se senta no sofá depois que a mulher sai para o trabalho.

O que estava acontecendo com ele?

Havia alguma coisa estranha acontecendo. Mas ele não sabia o que era. Havia um sentimento de peso no corpo, nas costas.

Será que ele tinha sido possuído pelo demônio? Será que aquele demônio que o pastor tirava do outro entrou nele?

Não podia ser.

O demônio que vira era forte demais.

Ele já teria feito besteira se fosse.

Deitou-se no sofá.

Fechou os olhos.

Dormiu sem perceber.

Acordou com a voz interna outra vez.

A voz começou a dizer no ouvido dele:

- Aquele cachorro se bandeou para o lado do demônio. Você precisa acabar com ele. Você precisa agir. Ele é do demônio agora.

Eugênio se levantou em um salto e foi ao quintal ver o Toby, o cachorrinho da família.

O animal era um vira-latas pequeno, branco, olhos grandes, orelhas caídas.

Ao vê-lo Toby balança o rabo fazendo festa.

Os olhos de Eugênio estão vermelhos de novo. Parece que há um fogo dentro dele queimando tudo. Ele olha Toby com repugnância como se olhasse para um monstro verde que estava atacando o planeta.

O cachorro percebe e começa a latir.

Eugênio vira-se de costas para ele e vai à cozinha apanhar uma faca.

A voz diz para ele quase gritando:

- Mate esse cachorro do demônio. Mate. Ele vai tomar conta da casa se não matar.

A cabeça de Eugênio roda.

Ele parece em surto.

Os olhos esbugalham.

Quando volta com a faca na mão esquerda, Eugênio caminha devagar, mas se sente mal. Ele não percebe o chão. Parece que pisa no ar.

A sensação é de que os espaços ficaram maiores e de que ele pisa longe.

A falta de sensibilidade o faz tropeçar e cair.

Eugênio bate com a cabeça na parede. Abre um ferimento e sangra. Ele desmaia.

Toby late desesperado.

O cachorro não entende o que aconteceu, mas percebe que há algo errado.

Bárbara chega no instante seguinte.

- O que foi Toby, o que foi?

Só então ela vê o marido estatelado no chão. A cabeça sangrando. Ele está desacordado.

- Eugênio, ela grita desesperada.

Ele continua desmaiado.

A mulher o socorre.

Ela estanca o sangramento com uma toalha e o reanima batendo em seu rosto e chamando por ele. Aos poucos, Eugênio vai voltando do desmaio. Ele abre os olhos devagar.

- O que aconteceu?

- Não sei. Cheguei e o Toby estava latindo muito. Vim ver e me deparei com você caído.

- Eu não sei o que aconteceu, meu amor.

- Você deve ter tropeçado e batido com a cabeça. Por isso não se lembra. Fez um corte na testa. Mas já estanquei o sangramento.

Os dois voltam para dentro de casa.

Bárbara apanha a faca do chão e a leva para a cozinha sem perguntar por que estava lá.

Eugênio deita-se novamente no sofá.

Já dormira até a hora do almoço, mas estava com uma debilidade física grande ainda.

 

Quando a mulher volta do trabalho no final do dia, Eugênio diz a ela que precisam ir ao templo.

- Eu acho que o demônio daquele homem entrou em mim. Eu me sinto possuído amor. Tem coisas estranhas acontecendo.

- Que coisas?

- É melhor nem falar disso, mas precisamos falar com o pastor. Ele precisa fazer alguma coisa. Vamos hoje, vamos.

- Está bem então, mas acho que tudo isso é besteira. Demônios não entram assim no corpo. O pastor vai te dizer, você vai ver.

Diante do pastor, Bárbara conta que o marido não se sente bem e que acha que está possuído.

O pastor diz que é muito difícil um demônio sair de alguém e entrar em outro assim, mas admite que é possível acontecer sim.

- Se você estiver possuído, vamos expulsar esse demônio agora mesmo, disse o pastor determinando que os obreiros preparassem tudo para a sessão de expulsão.

Em seguida, o pastor começou o ritual.

- Saia desse corpo demônio safado. Este corpo não te pertence. Saia, eu estou ordenando.

Eugênio sente que vai virar no avesso.

Parece que o que tem dentro dele quer sair e não encontra uma porta de saída.

Ele vira os olhos, arregala-os, chora, grita, baba. De repente, perde o controle dos braços. Eles socam o ar, se viram como se dançasse. Eugênio começa a erguer e abaixar a cabeça.

O sangue do ferimento volta a aparecer.

Bárbara intervém para tentar estancar o sangue novamente. Quando ela toca nele acontece como que uma descarga elétrica. Ele sacode o corpo dela como sacudia o seu.

Agora é Bárbara quem rola no chão.

Eugênio vai recobrando o equilíbrio novamente. Suado, ele mesmo tenta estancar o sangue agora. Enxuga a boca da baba.

Bárbara começa a babar. Revira os olhos. Eles ficam vermelhos do nada. Ela grita contra o pastor que passa a falar com ela agora.

- Saia desse corpo. Ele não te pertence. Saia de uma vez por todas. Eu te ordeno.

A sessão prosseguiu mais alguns minutos até que Bárbara parou de babar e se acalmou.

O pastor ficou cansado.

 

Em casa, mais calmos depois da agitação no templo, Eugênio tenta ser dócil com Bárbara.

Agora ele não sentia mais aquele incômodo com alguma coisa que não sabia o que era.

O rosto da mulher é agradável.

Ela sorri e ele gosta do sorriso.

Os dois vão se deitar.

Bárbara coloca uma camisola fina.

Eugênio se aninha atrás do corpo dela na cama fazendo carinhos nas pernas, nas costas, nos cabelos e a vira para beijar.

A mulher se afasta involuntariamente.

- O que foi?

- Nada, nada não amor. Acho que estou indisposta. É só isso. Desculpe.

- Poxa amor, logo hoje que estou animado.

- Desculpe.

Eugênio se levanta irritado e vai à cozinha para tomar um copo de água.

Bárbara vai atrás.

Quando o vê de costas em frente ao bebedouro esperando o copo encher de água, ela apanha uma faca de cozinha em cima da pia, segura o cabo com firmeza e a levanta para o golpe, mas é surpreendida por Eugênio.

Ele se vira e percebe o gesto.

Então segura a mão da mulher e, por ser mais forte, acaba tomando a faca dela.

- Você queria me matar, é isso?

- Não, claro que não.

- Queria sim.

- Alguma coisa me fez pegar aquela faca e partir para cima de você, eu não sei o que me fez agir assim. Desculpe amor, desculpe.

- Oxi, você está com o demônio ainda. Vamos ter de voltar ao pastor. Não tem jeito.

Bárbara ri sem parar.

Eugênio não entende nada.

- Era só uma brincadeira seu bobo. Estava gozando a sua cara por causa dessa história. Não estou com demônio nenhum. É só TPM.

- TPM?

- É.

- Então você está com dois demônios. Por via das dúvidas, vou dormir no outro quarto.


 

 

FIQUE SABENDO

Todas as terças e quintas tem uma crônica nova neste espaço.

Imagem da Galeria Quando forças sinistras tomam conta de nós é preciso se proteger
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