Me coloca no esquema

25 de abril de 2021

Me coloca no esquema

Data de Publicação: 25 de abril de 2021 14:38:00 DAS VEZES QUE MORRI E NÃO VALEU - Hoje trago o segundo capítulo da série de contos sobre as situações críticas em que quase perdi a vida.

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No episódio de hoje, conto uma ocorrência da minha adolescência, a primeira das várias vezes nas quais quase morri.

 

 

Na adolescência, vivia para pegar mulher.

Dito assim, dá a impressão de que fui um garanhão, como se dizia na época, naqueles doces anos 70, mas era exatamente o oposto.

Vontade não faltava, é claro.

O que não tinha era a habilidade para isso.

Eu não passava de um sujeito muito tímido, de corpo desengonçado e todo atrapalhado quando o assunto eram as mulheres.

O que me contenta é que, se não fui um conquistador nato como alguns dos meus colegas naquele tempo, não deixei de obter vitórias e de vencer as próprias dificuldades.

Não sem muito esforço e tremendas peripécias, além de fracassos e vexames.

Quando digo que vivia para pegar mulher é porque era o que eu mais pensava.

Não sei se por conta da falta de habilidade tão aparente ou se pela idade, talvez pelos dois, eu vivia para isso de verdade.

Não só, é claro, também gostava muito de jogar futebol, de escrever e ler e de música, mas o que me movia era pegar mulher.

 

- Me coloca no esquema, eu disse ao Paulo, um amigo um pouco mais velho. - Não posso perder essa chance. Vão muitas gatinhas?

- Claro que vão. E o legal é que ninguém fica no pé de ninguém. Elas vão pra curtir. Então é só chegar e ganhar a mina. Depois você passa o dia com ela. Pode sumir por lá, fazer o que quiser. Só precisa ficar ligado que tem horário para voltar e não pode deixar esperando.

O esquema era uma viagem para a Praia Grande de ônibus tipo bate e volta.

A excursão, como era chamada, ocorreria no mês seguinte, mais para o final, quase dois meses depois de quando conversamos.

Eu era um duro.

A viagem de fretamento era uma saída econômica muito boa em termos financeiros e me pareceu ideal para conquistar uma gatinha como eu tanto desejava.

- Vou ver com dona Lourdes. Ela é de Itu. É ela e a família dela que organizam.

- Fechado.

Dias depois o Paulo veio e me disse que estava tudo certo, mas me pediu que não aprontasse.

Dona Lourdes ficava responsável pelos menores, como eu, e não queria encrenca.

 

A preparação foi intensa.

Tive de juntar dinheiro segurando as saídas para o clube nos finais de semana e na sinuca, que jogava em um bar perto da praça principal de Salto, hoje Archimedes Lammoglia.

Ia ao Clube dos Trabalhadores todo final de semana: lá era o point.

Tinha uma turminha que andava sempre junto. Formamos o grupo no antigo ginásio, hoje fundamental dois. O número de participantes variava conforme a programação, mas tinha como eixo principal eu, o Wagner, o Thusca, o Paulo e o Kiko.

Jogávamos futebol e sinuca juntos.

Era a turminha que aprontava junto também e que se conhecia muito.

Nem todos eles eram duros como eu, mas nos dávamos bem apesar disso.

Para economizar, ficava jogando futebol o final de semana inteiro até mais tarde que o normal e depois faltava ao clube.

Também faltei a várias sinucas.

 

Sairíamos da Praça XV de Novembro em dois ônibus, que depois passariam em Itu e de lá partiríamos destino praia.

A partida seria a meia-noite.

Combinei com o Paulo, o único do grupo que iria além de mim, de nos encontrarmos antes para fazer um esquenta.

Como era muito tímido, de corpo desengonçado e todo atrapalhado quando o assunto eram as mulheres, queria tomar alguma coisa para ficar no clima.

Na casa do Paulo tomamos uns drinques malucos, que ele fez, que subiram rápido e que até hoje não sei o que tinham.

Para levar, montamos duas garrafas de caipirinha, usando PETs de Coca.

Começamos a beber por volta das dez horas.

Quando entrei no ônibus já estava muito solto e bem diferente do que era.

Com uma fala fácil e uma confiança fora do comum, eu estava pronto.

Em Itu entrou uma gatinha que eu gostei de cara só de olhar para ela.

O nome dela era Patrícia.

Começamos a conversar e o papo pegou firme.

Disse para mim mesmo: é essa.

O Paulo já tinha me dado as coordenadas de um lugar lá na Praia Grande onde eu podia levá-la e desaparecer o dia todo.

Vendedora de uma loja em Itu, ela me disse:

- Se eu fosse engraçada como você, ia faturar muito mais do que hoje na loja.

De fato, rimos bastante.

 

A Patrícia era uma adolescente bem bonita, mas que ainda não tinha desabrochado totalmente como mulher.

Tinha o corpo pequeno, os cabelos curtos e castanhos como os olhos. Um sorriso cativante. Mas o destaque que me atraiu foram os seios.

Ela os tinha proeminentes e um pouco maiores para o seu tamanho, eu acho.

Eu parecia carro velho que anda no cheiro da gasolina e toda hora precisa ser reabastecido.

O assunto ia diminuindo, lá ia eu e dava uma golada na caipirinha engarrafada em uma Coca de dois litros, que esquentava à medida que a andávamos.

Depois de algum tempo, chamei a Patrícia para nos sentarmos no fundo do ônibus.

Os últimos bancos ficaram vazios.

Duas duplas não tinham vindo e só um cara estava no banco do corredor.

Pedi que trocasse de lugar com a gente.

Eu só pensava naqueles seios.

O ataque começaria ali mesmo.

 

Quando já estávamos lá no fundão havia algum tempo, ela continuava com jogo duro.

Voltei ao combustível.

Mais elétrico, a conversa fluía.

Finalmente, após algum tempo, começamos os beijos e os abraços mais quentes.

Naquela época a estrada para Santos não era nada boa, nem perto do que é hoje.

Os buracos faziam o ônibus sacudir muito.

Eu já tinha tomado tanto daquela caipirinha quente e mais o que bebi na casa do Paulo, tudo sem comer nada, que comecei a passar mal.

A Patrícia me perguntava:

- Você está bem?

Lembro de ter ouvido umas três ou quatro vezes ela perguntando.

Eu queria responder, mas não conseguia.

A língua solta estava travada agora.

Comecei a transpirar sem parar.

O coração acelerou de repente.

Tudo começou a rodar.

A voz da Patrícia foi ficando longe e as músicas, que tocavam bem altas antes no ônibus, foram sumindo.

Não demorou e veio aquele jato quente do fundo das minhas entranhas.

Como estava virado de frente para a Patrícia, o vômito saiu na direção dela e com uma força fenomenal: parecia mais petróleo jorrando.

A maior parte do jato atingiu os seios dela.

Lembro de ouvi-la dizer:

- Ai que nojo.

A Patrícia saiu dali para se limpar na mesma hora e não voltou mais.

Eu ainda vomitei os bofes no fundão inteiro.

Melhorei só quando cheguei na praia. Passei o dia mareado. A volta para casa foi em um banco lá da frente, fingindo que dormia.

A Patrícia nem quis olhar na minha cara.

 

A galera me zoou por uns dois meses.

Acho que nunca passei tanta vergonha.

Resolvi esquecer a Patrícia e os seios dela.

Voltei a frequentar o Clube dos Trabalhadores e retomei a minha saga de tentar ser um pegador de mulher.

Em um dos sábados, disse para mim mesmo: é hoje o dia da virada.

Estava muito focado.

Tinha melhorado bastante a abordagem e já tinha saído com três meninas depois do episódio da Patrícia, mas nenhuma tinha sido significativa para mim.

Eu buscava alguém marcante que todo mundo comentasse, aquela conquista mesmo.

Naquele sábado estava me sentindo especialmente preparado.

No futebol à tarde, o Kiko falou de uma menina que chamou a minha atenção.

A Alice tinha ganhado até um apelido no grupo, dada à dificuldade que impunha.

- Ninguém consegue ganhar essa mina. Ela despacha todo mundo de cara, disse o Kiko.

Só aí entendi o apelido: Minutinho.

- Mas o que acontece?, perguntei.

O Paulo explicou que ela tinha pavio curto. Não tolerava conversa mole.

- É mina pra casar, disse para valorizar ainda mais a conquista.

- Então estou fora, eu disse.

- É maneira de dizer, ele se explicou.

O Kiko era o mais apaixonado.

- Ela é pequenininha, mas tem um corpinho desenhado na prancheta.

- Qual é o lance?, quis saber o Wagner.

- O lance é que nós vamos fazer uma aposta aqui: quem ganhar a Minutinho, ganha um mês de sinuca grátis, com direito a cerveja.

- Opa, tô dentro, foi a voz em uníssono.

Naquele sábado ainda que eu estava me sentindo preparado, eu disse: é hoje mesmo.

Mas antes do clube, eu e a turma fomos jogar sinuca no bar da praça.

Sempre que íamos jogar, tomávamos cerveja, vodca e conhaque, conforme o dia.

Além disso, comíamos os salgados do bar.

Jogamos até umas dez horas.

 

Naquele sábado tinha baile, o que hoje virou balada. Seria com o grupo Placa Luminosa. Sempre que eles vinham era um showzaço.

O baile começava às onze.

Enquanto esperávamos ficávamos na frente do clube azarando as meninas.

O Clube dos Trabalhadores funcionava onde hoje é a Biblioteca Municipal, pertinho da praça principal, a Archimedes Lammoglia.

A Minutinho não estava por lá ainda.

Então aquele período era treino.

Sentei-me com uma das meninas que tínhamos conhecido ali e começamos a conversar muito animados.

Eu estava bem mesmo.

A Flavinha, essa menina, ficou encantada comigo e engatou uma conversa sem fim.

Mas, de repente, começou a me dar umas apertadas doloridas na barriga.

Do nada.

Parecia uma cólica.

Eu fui ficando amarelo.

Devia ser o salgadinho do bar da sinuca.

Virou-e-mexeu eu não me dava bem com algo que tinha naqueles salgadinhos.

- Você está bem, ela perguntou.

Desta vez pude responder:

- Não.

As apertadas na barriga me davam um sinal: eu tinha de ir ao banheiro e tinha de ser logo, senão as coisas ficariam piores.

O problema é que o clube estava fechado e o bar da sinuca ficava longe para a pressa e angústia que eu sentia naquele momento.

À época, onde hoje funciona uma loja de produtos do Brás, era um barzinho fuleca.

Ele ficava ali do lado do largo em frente ao Clube dos Trabalhadores.

Não tive dúvida, expliquei para a Flavinha e fui resolver o problema.

- Amigo, posso usar o banheiro?

O dono do bar me olhou com um certo desprezo, talvez pela minha cara amarela.

Mas pegou a chave e me deu.

O banheiro ficava no alto de uma escada que devia ter uns 30 degraus.

O prédio tinha dois andares à época.

Hoje é só térreo.

A escadaria ficava bem do lado do largo em frente ao clube e não tinha janela.

Subi aquelas escadas sem nem pensar.

A situação era muito crítica.

No final da escada gigante tinha uma porta de madeira bem velha, que estava trancada.

Abri com a chave que o dono do bar me dera e me enfiei para dentro já desabotoando a calça.

Foi o tempo de abaixar as calças e aquilo despencou a uma velocidade assustadora.

Não só.

Parecia festa junina com os rojões.

Ainda tinha aqueles fogos de artifício que se espalham por todo lugar e que, quando falham, acertam quem está perto em cheio.

Quando me senti recuperado é que me dei conta da situação que enfrentaria.

Os fogos de artifício se espalharam pelo lugar todo, afinal eu não tinha sentado no vaso, dada a sujeira antiga que ele tinha.

E não havia uma só folha de papel higiênico.

- Não acredito nisso.

Com o lugar, não estava muito preocupado, mas eu tinha de me limpar.

Não havia nada lá.

Era o vaso sanitário, uma caixinha de descarga daquelas de cordinha e nada mais.

Sem alternativa, tirei a cueca e a usei no lugar do papel higiênico.

Só que não fui suficiente.

- O que vou fazer agora?, eu me perguntava.

Não estavam fáceis as coisas.

O jeito foi tirar as meias.

Depois disso, perdi toda a eloquência que achava que tinha antes.

Os outros tentara conquistar a Minutinho, mas ninguém obteve sucesso.

- Semana que vem, eu resolvo, brinquei.

Todos riram da minha cara de novo.

- Se você conseguir não vazar por nenhum lado, né?, sentenciou o Wagner.

Eu estava na pior mesmo.

Para completar, ainda levei choque em casa quando fui tomar banho.

 

Tinha me tornado sócio do Guarani, um dos dois times de futebol profissional da cidade.

Influenciado pelo Geny, irmão do Thusca, que era um exímio nadador, eu queria aprender a nadar bem e ele ficou de me ensinar.

No sábado seguinte ao vexame do banheiro, fui fazer exame médico.

Parei atrás de uma amiga do Geny.

A Leonor começou a conversar com ele e logo mexeu comigo por meio dele:

- Não apresenta os amigos?

- Ah, desculpe. Esse aqui é o Eloy, amigo do futebol. Ele ficou sócio aqui.

- Prazer, eu disse com um sorriso maior que a boca enquanto estendia a mão a ela.

Era mais uma chance, pensei.

- O prazer é meu, disse ela também com um sorriso gigante e ainda segurou a minha mão sem largar por alguns segundos.

Geny, que não era bobo nem nada, disse:

- Por que não convida ela para o clube hoje?

Eu até achei uma boa ideia, mas estava pensando na aposta da Minutinho.

Quis garantir as duas possibilidades e, se a Leonor, me visse tentando convencer a outra, não iria querer mais nada comigo.

- Hoje acho que não vou ao clube, disse.

- Como não vai? Todo mundo vai estar lá. Você não pode furar.

- Faz tempo que não vou ao clube, ela disse.

- Que tal um cinema, eu sugeri para desviar o foco do clube e não me atrapalhar mais.

Geny não entendeu nada, mas se calou.

A Leonor era bonita.

Tinha a pele morena como se pegasse praia todo dia. Os cabelos castanhos encaracolados. Os olhos esverdeados. Não era alta.

Adorava dançar, principalmente samba.

E tinha ficado encantada comigo sem nenhum motivo especial, pois só conversamos um pouquinho na fila e eu nem tinha me atirado a conquistá-la.

Gostei disso.

Só que não era ela também.

Meu foco estava na Minutinho.

Pegamos o cinema e depois fui levá-la em casa. Ela morava longe para dedéu.

O lugar era bem escuro.

Tudo isso facilitou as coisas.

 

Na semana seguinte, me encontrei com a Leonor na piscina do Guarani.

Ela riu muito das minhas aulas de natação.

Sempre fui desengonçado.

Não podia ser diferente na água.

Tinha um corpo muito magro e era bem alto. Os braços eram maiores do que o normal.

Tudo isto me fazia mais espalhar água que nadar propriamente dito.

Mas acabei fazendo um bom papel no final.

Mesmo que não fizesse, ela me perdoaria por qualquer coisa, apaixonada como estava.

Mesmo assim, dei uma desculpa para não sair com ela naquele dia. Queria e fui ao clube para concorrer na aposta.

Apesar de não ter participado por duas semanas, ninguém havia ganho.

Observei a Minutinho de longe.

Era uma menina bonita também.

Pequena, magra e com um rosto angelical, ela parecia muito decidida.

- Eu estou caindo fora. Não rola. A mina é muito difícil. Acho que não quer nada.

A fala do Wagner era para desencorajar, mas eu não desanimei não. Queria tentar. O não eu já tinha e não perdia nada em tentar.

A Minutinho estava na parte de cima.

Para quem não conhece o prédio, na parte térrea, ele tinha uma área bem ampla onde se dançava e onde ficava também o palco. O segundo andar era formado por corredores que circundavam o salão de dança na frente do palco. Toda a parte do salão era aberta em cima. Por isso, de lá era possível ver quem dançava embaixo e dava para ver melhor também o grupo que se apresentava.

Dei uma volta pelos corredores do segundo andar e me dirigia para ela quando vi a Leonor cruzar a minha frente.

- Ué, você não disse que estava gripado?

- Estava e estou, emendei rápido.

- Mas melhorou do nada, né?

- Foi, quer dizer, não melhorei muito não, mas resolvi vir para te ver.

- Para me ver? Como assim, eu não disse que viria. Você não veio aqui para me ver.

- Vim, o Geny me disse que você viria.

Nesse momento, o Geny chegou perto de nós e nos abraçou dizendo:

- Que bom que você veio Leonor.

- É verdade, eu disse. – Estava contando a ela que você disse que ela viria e por isso eu vim, mesmo com a gripe forte.

Geny, que não era bobo nem nada, emendou:

- É verdade Lê. Ele estava mal pacas. Mas queria te ver e veio.

Ela abriu o sorriso gigante de novo.

E tudo ficou bem.

- Ufa, eu disse no ouvido dele.

- Me deve essa, retrucou ele.

Com isso, a aposta acabou sendo cancelada.

A Minutinho não era para nós.

 

Uma semana depois.

- E aí vamos nadar no Piraí?

- Não sei Geny. Acho que ainda não estou bem o suficiente para nadar em um lugar assim. É fundo lá, não é?

- Tem lugar que é, mas a maioria não é.

Eu tinha medo de não conseguir e afundar, mas, ao mesmo tempo, tinha adrenalina com os desafios e resolvi testar na prática as aulas.

A ideia era pescar e fazer um churrasquinho nas margens do ponto de captação de água do ribeirão Piraí, que era e ainda é o principal manancial de abastecimento de Salto.

Não se podia nadar lá, mas a aventura de desafiar o proibido era maior.

Fomos eu, Geny, Wagner, Kiko e Paulo.

Montamos um acampamento improvisado e começamos o papo sobre as meninas.

A Minutinho era o assunto, mas passamos também pela Leonor e pelas outras que cada um havia conquistado recentemente.

Finalmente o assunto recaiu sobre a Patrícia e a viagem à Praia Grande.

A gozação de antes recomeçou.

Fiquei irritado e quanto mais eu me irritava, mais eles caçoavam de mim.

Para evitar que aquilo continuasse, larguei todo mundo lá e fui à margem do ribeirão.

Medi o espaço e pulei como se fosse um exímio nadador. De cara afundei quase até a parte de arbustos que havia no fundo. Depois emergi e comecei a bater braços e pernas.

Todo mundo aplaudiu ao ver.

O canal não era muito largo naquela região.

Então comecei a me dirigir para o curso da água e seguia de boa.

Estava me sentindo o nadador.

Os outros se animaram e abandonaram o churrasco por um momento.

Eles foram para um ponto onde dava para saltar e começaram a se projetar para a água.

A brincadeira pegou fogo.

Todos saltavam, mergulhavam fundo e voltavam nadando para repetir.

Juntei- me a eles e comecei a saltar também.

Rimos muito da brincadeira.

Com exceção do Geny, a maioria nadava razoavelmente como eu. Ninguém se afogaria, é verdade, em uma situação normal.

Mas à medida que o tempo passava, começou a ventar e a correnteza ficou mais forte.

Quando a gente caía na água, era arrastado para um ponto bem mais abaixo.

Até isso passou a ser divertido.

A gente lutava contra a correnteza e tentava voltar nadando, mas era impossível.

A água era mais forte que nós.

Então saíamos da água e caminhávamos pela margem até chegar ao ponto de saltar.

Cada vez que caíamos na água éramos arrastados para um lugar mais longe.

Em uma das vezes, fui parar na parte funda.

Nadava normalmente.

Mas aí alguém gritou:

- Cuidado Eloy. Aí é muito fundo. Não vá aí.

Aquela frase foi uma maldição para mim.

Toda aquela insegurança que os meus colegas haviam provocado em mim, momentos antes, com as bobagens que tinha feito, veio com tudo para me aterrorizar.

Na minha cabeça uma voz gritava:

- Você vai afundar, saia daí, você não sabe.

Não se passaram nem dois minutos e afundei. Eu batia braços e pernas como um louco, mas não conseguia mudar o curso das coisas. Afundei novamente.

Bebi muita água.

Ouvia os gritos de desespero dos meus amigos. O som da voz deles aumentava e abaixava. Depois parecia entrar em uma caixa que produzia um eco. O barulho de água.

Nunca esqueci aquele momento.

Tudo foi ficando escuro.

Afundei novamente.  

A sensação de frio tomava conta de mim.

Enquanto todos gritavam para eu sair, Geny pulou na água e mergulhou para me buscar. Ele me pegou pelos cabelos e puxou.

Em seguida, abraçou a minha barriga e foi nadando com um braço só e as pernas.

Ele tinha muita força e habilidade.

Subimos e foi como se aspirasse todo o ar do mundo. Um gosto de sangue encheu a minha boca. Geny me arrastou até perto da margem.

- Segure aí, segure aí, gritou.

Havia um pedaço de árvore debruçado sobre o ribeirão. Eu me apoiei nele. Enquanto isso ele puxava o ar tanto quanto eu.

Aos poucos, fui tirado da água.

Com as massagens na barriga, vomitei água, muita água. Os olhos vermelhos, uma dor abdominal grande. Melhorei.

- Véio, você quase mata a gente de susto, disse o Geny abrindo um sorriso gigante.

Todo mundo começou a rir também e alguns me deram tapas nos braços e ombros.

Eu sabia o que fora e só pude dizer:

- Obrigado gente.

 

 

Anote isto

A ideia desta série é reunir todos os acidentes ou situações graves em que me envolvi ao longo da vida e que quase me mataram. Costumava dizer que tinha sete vidas como os gatos. Risos. Mas depois de ver o filme "A nona vida de Louis Drax" descobri que podem ser nove vidas então. Nesses acidentes ou situações graves estive à beira da morte em pelo menos oito. Assim, devo estar na minha última vida. Será?

Alguns nomes são fictícios nessa história para preservar os envolvidos.

Imagem da Galeria É um erro tentarmos ser o que não somos apenas para ficar bem com o meio
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