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Gestor tem de tomar decisão sempre
Data de Publicação: 23 de janeiro de 2021 20:51:00 O cargo exige que se conduza a sua equipe a cada passo e muitas vezes essa direção precisa ser indicada instantaneamente.
Faz parte dos rituais do cargo apontar o caminho que a equipe vai seguir. Muitas vezes essas direções precisam ser definidas instantaneamente. Mas sempre elas têm de levar em conta as repercussões.
- O que fazemos agora?
Foi essa pergunta que a Simone Sanches, que era chefe da área de jornalismo da Secretaria de Comunicação e Eventos da Prefeitura de Sorocaba me fez após apresentar o problema.
O que estava acontecendo naquele domingo, em que eu participava do curso de noivos da minha filha, era que a mãe da então vice-prefeita Jaqueline Coutinho (na época no PTB), dona Neide, havia divulgado no facebook que sua filha fora desrespeitada pelo então prefeito José Crespo (DEM).
Como secretário de Comunicação e Eventos, eu deveria tomar uma decisão, já que a imprensa toda queria saber o que a Prefeitura tinha a dizer e precisava ser logo.
Eu estava no meio da aula do curso de noivos quando recebi a primeira ligação. Não atendi de pronto. Simone insistiu por várias vezes. Resolvi sair do Centro Comunitário da Igreja de Nossa Senhora do Monte Serrat para ver o que era. Devia ser importante para tanta insistência e era realmente.
Disse a ela:
- Me passe todas as informações primeiro.
Ela foi levantar o que possivelmente faltasse.
Consegui terminar a aula e segui para a missa na igreja ao lado.
No meio da missa, novas ligações insistentes.
Voltei a me afastar para atender.
Eu sabia então do que se tratava.
Na sexta-feira, Crespo voltara de uma viagem internacional e quem fora buscá-lo junto com o motorista era a sua então secretária Taty Polis, com quem a vice se desentendera.
No caminho, a secretária disse que Jaqueline pressionou-a a deixar o cargo sob a acusação de que não tinha diploma universitário, exigência legal para a nomeação.
Afirmou que fora humilhada e que não achava justo, uma vez que tinha apresentado o diploma e a universidade confirmara a veracidade no momento da sua contratação.
É preciso explicar ao leitor que Taty Polis era protegida do prefeito por alguma razão que até hoje se desconhece.
A informação dela deixou Crespo irritadíssimo.
Quando chegou à Prefeitura, ele disse que queria falar com a vice-prefeita urgentemente. Ela não estava. Marcaram de se encontrar por volta das 11h, um pouco antes da reunião da qual eu participaria para discutir uma greve de motoristas de ônibus. A paralisação fora iniciada um dia antes e fora a razão pela qual o prefeito antecipou o seu retorno, antes previsto para o domingo.
Não estava presente à reunião do prefeito com a vice. Apenas o então secretário de Gabinete Central, Hudson Zuliani, uma espécie de secretário de Governo, presenciou. Mas fiquei sabendo.
Ao chegar para a minha reunião, o prefeito gritava destemperado e um assessor me pediu para esperar na sala à saída do elevador até que as coisas se acalmassem.
Não sabia o que estava acontecendo. Se soubesse, teria entrado para tentar evitar o pior, embora quando cheguei a vice e o secretário já tivessem se retirado do gabinete.
Só restavam os gritos de Crespo.
O que se passara lá é que o prefeito exigira que Jaqueline se retratasse com a secretária. Disse que ela, a secretária, não teria sido tratada com respeito. Evidentemente, a vice deu de ombros.
O secretário também não gostou da atitude do prefeito.
Ambos discutiram em altos brados.
O desentendimento geral foi o que levou Crespo a gritar mesmo depois que os dois saíram e foi o que ouvi ao chegar.
Boa parte disso era o relato que a mãe da vice publicara no facebook na tarde de domingo, colocando o assunto a público.
Após a reunião sobre a greve, falei com o prefeito e com o secretário Zuliani para entender o que ocorrera. Ciente, pedi aos dois que não falassem nada a respeito. Disse que falaria com a vice também e tentaríamos evitar um escândalo.
Jaqueline foi embora para casa sem que eu pudesse lhe falar.
Continuei tentando até o início da noite, sem sucesso.
No sábado pela manhã, um jornalista me procurou dizendo que sabia de toda a história, mas que não divulgara porque achava que aquilo seria nitroglicerina pura e era realmente.
Eu pedi a ele que não desse essa informação, pois eu tentaria reunir os três e acabar com o desentendimento.
Ele me atendeu.
Com o prefeito e o secretário estava tudo acertado, mas não conseguia contato com a vice. Ela não atendia o telefone. Havia tentado novamente um pouco antes do curso de noivos.
A partir da informação da Simone Sanches, eu tinha de agir.
Não dá para você se tornar um gestor e não tomar decisão.
Uma das principais obrigações de alguém nessa posição é definir a direção que a equipe toma a cada momento.
Pode parecer um tanto quanto complicado, pois, quando se fala em apontar um caminho, logo se pensa em fazer uma análise demorada de todas as possibilidades.
Isto é o que se deve fazer, sem dúvida.
Nem sempre, contudo, é possível e é oportuno.
Muitas vezes temos de decidir no auge da crise e um passo em falso pode comprometer todo o resultado.
Era essa a minha situação sozinho e de cabeça muito quente na porta da igreja ao telefone.
Em alguns segundos disse a Simone que emitisse uma nota oficial informando que a divulgação da mãe da vice exigia o levantamento antes de todas as informações a respeito para uma manifestação oficial da Prefeitura em nome do prefeito.
A nota fixava a segunda-feira como data dessa manifestação.
Pronto: estava resolvido.
Se conseguisse celebrar a paz no trio na manhã de segunda, apagaria o incêndio rapidamente sem vítimas graves.
Só que fui surpreendido na segunda-feira com a vice na rádio Ipanema dando uma entrevista na qual abriu fogo contra o prefeito definitivamente, acusando-o de proteger a secretária.
Liguei para ela na rádio e propus a paz.
Ela concordou e disse que eu a encontrasse em sua casa à tarde, logo depois do almoço, já que demoraria a sair da rádio.
A vice ficou a manhã inteira em entrevista.
À tarde fui para a casa de Jaqueline por volta das 14h. Conversamos a respeito de tudo o que ocorrera e dos sentimentos dela e da mãe, que a defendera à sua revelia, segundo ela.
- Não pedi e não concordei com o que ela fez, disse Jaqueline.
A mãe tomara a iniciativa por conta própria.
Disse que entendia a situação, mas que era necessário que os três fizessem as pazes para que o escândalo acabasse.
Jaqueline concordou comigo e disse que por ela não haveria mais nenhum passo nessa direção, apesar de que continuaria a sua ação para destituir a secretária do cargo, a quem considerava a causadora de toda a discórdia e de toda a crise.
Eu dei razão a ela.
Realmente Taty era a pivô de tudo.
Voltei ao prefeito e contei o resultado.
Ele achou que não bastava.
Fez um documento no qual os três (ele, o secretário e a vice) diziam que se entenderam em nome do governo. Afirmava que o que havia acontecido e sido divulgado pela mãe da vice fora um mal-entendido. Em seguida assinou e pediu ao secretário Hudson Zuliani que assinasse também e ele o fez.
- Consiga assinatura da Jaqueline e divulgue, disse Crespo.
Achei desnecessário o documento, mesmo assim voltei à vice.
Mãe de dois filhos, ela tinha saído para ir ao mercado comprar o que eles precisavam de forma mais urgente.
Pediu por telefone que eu esperasse o seu retorno.
Fiquei plantado na porta da sua casa.
Cheguei perto de 18h e ela só retornou depois das 19h.
Conversamos, expliquei a situação e mostrei o documento.
Jaqueline leu e, de forma sensata, concordou e assinou.
Divulguei o documento e a manifestação oficial da Prefeitura quando já estávamos perto das 20h.
Dei o caso por encerrado.
Fiz uma avaliação com a minha equipe sobre as decisões tomadas e todos concluíram que foram as mais acertadas.
Havia críticas de alguns setores da imprensa sobre a demora para o posicionamento, mas achamos irrelevantes.
Afinal, não se toma uma decisão oficial quando se é o responsável pela comunicação de uma Prefeitura sem se avaliar os danos políticos que isto possa gerar.
Meu papel era de gestor e também de assessor político.
Infelizmente, todo o esforço. no sentido de buscar a decisão melhor e uma solução que não afetasse o governo, foi em vão.
Cerca de uma hora e meia depois da divulgação da minha nota oficial, a vice-prefeita foi ao facebook e voltou atrás no documento que assinara e no que combinara comigo.
A partir dali, em virtude da insensibilidade política do prefeito e da estranha e incoerente proteção que ele deu à secretária, criou-se uma crise sem tamanho que culminou na sua cassação.
De qualquer forma, cumpri o papel de gestor e de assessor político até onde pude e tentei evitar o fim até onde deu.
Mas não se cura doente que não aceita tratamento.
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